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segunda-feira, 6 de abril de 2015

TEATRO NO DIREITO - UMA EXPERIÊNCIA DE LEITURA DRAMATIZADA A PARTIR DE AUTOS PROCESSUAIS

TEATRO NO DIREITO - UMA EXPERIÊNCIA DE LEITURA DRAMATIZADA A PARTIR DE AUTOS PROCESSUAIS
Registro de memória pelas lentes da pesquisadora Jaque Sousa que participou de minicurso de mesmo nome, junto ao "I Seminário de Pesquisa em Fundamentos do Direito da Faculdade de Direito "Prof. Jacy de Assis" da Universidade Federal de Uberlândia", ministrado por Eliene Rodrigues de Oliveira, em dezembro de 2012:
"D-E-S-C-O-N-S-T-R-U-Ç-Ã-O! Tirem os sapatos, relaxem os braços, movimente o corpo, deixe-o fluir naturalmente. Assim iniciou uma das mais nobres experiências que tive no curso de Direito. Experiência, palavra misteriosa, muito utilizada no mundo moderno, pouco compreendida. É para Larrosa “o que nos passa, ou o que nos acontece, ou o que nos toca”. É o nosso mundo. Tantas coisas e experiências raras. Encontro o melhor sentido para traduzir a oficina: transformação! No início, estávamos apreensivos, sérios, tímidos. O curso de Direito nos deixa de certa forma,moldados, enrijecidos, o que será discutido mais adiante. O primeiro contato com as artes permitiu um conhecimento profundo do outro, uma forte ligação com os envolvidos, sensibilidade humana. Não esperava num primeiro momento ficar
descalça, me despir de todos aqueles padrões que em mim estavam incrustrados. “Arte e Direito, será que combina?”. Esta indagação não foi apenas minha, mas certamente ocorreu com os demais colegas. [...] Aos poucos o corpo foi se libertando de moldes e um novo espaço para aprendizado foi aberto. A comunicação com o outro, a colocação da voz ocorreu sem necessidade de nenhum curso de oratória, bastou apenas a nossa espontaneidade. Aliás, espontaneidade essa que me parece cada vez mais rechaçada pelo Direito. O que se ensina, na maioria destes cursos intensivos de oratória é como portar-se durante determinada explanação. O dinamismo, a comunicação descontraída, a essência do “eu” parece não ser bem vinda, vez que a imagem deve estar sempre impecável, dentro dos padrões. A leitura dramatizada trazida no minicurso foi fundamental, pois, possibilitou que nos colocássemos no lugar, ora do réu, ora do advogado, ora dos familiares das vítimas, ora das impotentes autoridades. Essa inversão de papeis possibilitou grande sensibilização, vez que nos colocamos no lugar daqueles que cotidianamente, não pensamos duas vezes antes de proferir os mais perversos julgamentos. Observei então, a possibilidade que o Teatro nos oferece de trabalhar a tolerância, do colocar-se no lugar do outro como ponto de partida para futuras conclusões. Na literatura, em 1962 Clarice Lispector percebera que esta poderia ser um instrumento de indignação, de humanização. Em seu conto, Crônica sobre a morte de Mineirinho, escreveu: “Mas há alguma coisa que, se me faz ouvir o primeiro e o segundo tiro com um alívio de segurança, no terceiro me deixa alerta, no quarto desassossegada, o quinto e o sexto me cobrem de vergonha, o sétimo e o oitavo eu ouço com o coração batendo de horror, no nono e no décimo minha boca está trêmula, no décimo primeiro digo em espanto o nome de Deus, no décimo segundo chamo meu irmão. O décimo terceiro tiro me assassina — porque eu sou o outro. Porque eu quero ser o outro.” Em sua exposição, ao retratar o assassinato de um foragido do manicômio judicial por 13 tiros de metralhadora disferidos pela polícia, Clarice coloca-se no lugar do outro e faz uso da literatura para expor indignação e promover a sensibilidade. Retornando à oficina, o Caso escolhido para o trabalho, também teve grande influência nos resultados. Por se tratar do tido maior erro judiciário brasileiro, o caso traz em seu bojo certa peculiaridade. Impossível ficarmos alheios diante dos fatos, das torturas, dos excessos cometidos. Em contrapartida, só foi possível essa sensação porque vivenciamos, fomos “tocados”, tivemos experiência." (JAQUELINE SOUSA, 2013. In.: Teatro no Direito um relato de Memórias.)

Teatro no Direito um relato de Memórias. II Encontro Internacional de Direitos Culturais - UNIFOR - ST5 – Direitos Culturais e Transversalidades
Fonte: http://direitosculturais.com.br/anais_interna.php?id=3
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